quarta-feira, 9 de abril de 2008

Bittar apresenta nova proposta para regulamentação da TV paga


Cristina Charão e Diogo Moyses, para o Observatório do Direito à Comunicação
07.04.2008

O deputado Jorge Bittar (PT-RJ) divulgou hoje (7) a versão do Projeto de Lei 29 que passa a ser apreciada pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática a partir da quarta-feira (9). Nesta nova redação, Bittar considera as 145 emendas apresentadas ao seu relatório inicial, apresentado em dezembro, mas reflete especialmente as pressões diversas sobre o conteúdo do projeto.

A proposta de criar uma política de cotas para a produção nacional independente gerou reação violenta por parte das operadoras de TV a cabo, das programadoras internacionais e também da Rede Globo. A pressão levou Bittar a retroceder nos percentuais propostos originalmente e, em uma das versões apresentadas à imprensa, retirar inclusive a menção à produção independente.

Esta opção do relator acabou por criar desconforto entre os atores que apoiavam o projeto por conta, essencialmente, das cotas para a produção nacional independente. Articulados com outros atores minoritários no setor da TV por assinatura, os produtores independentes conseguiram apresentar uma proposta que voltava a incluir cotas para produção independente e também cláusulas que limitam a presença de uma única programadora nos pacotes de canais.

Em meio a este fogo-cruzado, o relator entrega à comissão um projeto que tenta costurar interesses diversos. Na colcha de retalhos, perdem espaço as cotas para independentes, ganham algumas vantagens os radiodifusores (especialmente a Globo) e se acelera a entrada das teles no mercado de TV por assinatura.

Veja os principais pontos do texto apresentado por Bittar à CCTCI:

Cota transversal de conteúdo brasileiro

Todos os canais com conteúdo majoritariamente qualificado (filmes, seriados, novelas, reality shows) terão de exibir 3h30 semanais de conteúdo brasileiro, cuja definição agora exclui as co-produções. Originalmente, o texto previa uma porcentagem do horário nobre. Segundo o novo relatório, as 3h30 equivalem aos 10% previstos na proposta original.

Destas 3h30, metade “deverá ser produzida por produtora brasileira independente”. Originalmente, toda a cota era destinada a produções independentes. Segundo o texto de justificativa apresentado por Bittar, esta previsão dá mais “liberdade à programadora no preenchimento da grade“, usando conteúdo de “produtoras consideradas não independentes – inclusive radiodifusores”.

A nova versão cria duas exceções à regra: os canais não-direcionados a brasileiros (transmitidos sem dublagem ou legenda) e o chamados canais pan-regionais, cujo sinal único é transmitido para vários países (por exemplo, para toda a América do Sul). No segundo caso, caberá à Agência Nacional do Cinema (Ancine) avaliar se há ou não condições técnicas para que a programadora cumpra as cotas.

Outra novidade é a permissão para a compensação das cotas de conteúdo entre os canais de um mesmo grupo empresarial.

Cota de canais brasileiros

A nova proposta é mais restrita e detalhada: 25% dos canais que compõem um pacote deverão ser brasileiros, sendo que 1/3 deles criados por programadores independentes. Ou seja: uma única empresa poderá ter, no máximo, 2/3 da cota de canais nacionais.

Para um canal ser considerado brasileiro, terá de veicular 8 horas diárias de produção nacional, sendo 4 horas em espaço qualificado. Dessa última parcela, 2 horas deverão ser veiculadas no horário nobre, sendo que 1 hora desta programação terá de ser produzida por independentes.

Bittar também introduz um limite para as cotas: 10 canais nacionais, sendo 3 deles independentes. Ou seja, num pacote hipotético com 50 canais, a obrigação da operadora é oferecer não 12 canais BR, mas apenas 10.

Horário Nobre

Para efeito de aplicação das cotas, a Ancine decidirá sobre o período que será considerado horário nobre, de acordo com o público-alvo de cada canal.

Prazo para validade das cotas

As cotas previstas no projeto serão válidas por 15 anos após a aprovação do regulamentação da nova lei. Antes, não havia previsão para o fim das cotas.

Teles no mercado de TV por assinatura

Uma das questões mais importantes do projeto (talvez a sua principal motivação) é a revogação das disposições regulamentares e das cláusulas dos contratos de concessão de STFC (Serviço de Telefonia Fixa Comutada) que proíbem a prestação do serviço de TV a cabo pelas concessionárias de telefonia fixa. Se aprovado, as teles passarão a poder prestar serviços de TV por assinatura (que juridicamente passará a ser chamado de Serviço de Acesso Condicionado – SAC).

Divisão do mercado

O novo relatório de Bittar limita em 30% do capital total e votante a presença das empresas de telecomunicações nos ramos da produção e da programação, bem como em empresas concessionárias de radiodifusão. As teles poderão controlar, portanto, apenas empresas de distribuição de TV por assinatura. O contrário também está previsto: o mesmo limite de 30% vale para a participação de empresas de radiodifusão, produtoras e programadoras no capital total e votante de empresas de telecomunicações.

Produtoras independentes

Fica permitida a participação de empresas concessionárias de radiodifusão, programadoras, empacotadoras ou operadoras nas produtoras consideradas independentes, dentro de um limite de 20% do capital votante. Não será permitido aos sócios minoritários, no entanto, exercer poder de veto sobre a comercialização das produções. Para ser considerada independente, uma produtora não poderá, ainda, ter contrato de exclusividade com uma programadora (ou canal).

Programadoras independentes

Passa a ser considerada programadora independente aquela que “não seja controladora, controlada ou coligada de programadoras que programem mais do que 1/3 (um terço) dos canais do pacote ou de sua empacotadora ou distribuidora”. Este critério abre espaço para pequenos programadores nos pacotes de canais oferecidos ao assinante.

Ancine

Outro recuo de Bittar diz respeito às responsabilidades da Ancine, que não terá permissão para instruir o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em questões concorrenciais sobre o mercado audiovisual. A agência deverá somente fomentar a produção de conteúdo nacional e regular e fiscalizar as atividades de programação e empacotamento, enquanto que a Anatel permanecerá com a responsabilidade de dispor sobre a distribuição.

Publicidade

Com relação à publicidade nos canais de televisão por assinatura, foi estabelecido o mesmo limite de 25% previsto para as concessionárias de radiodifusão, com a ressalva da possibilidade de fixação de parâmetro distinto para programações destinadas para
crianças e adolescentes.

Mudanças no must-carry

A proposta divulgada mantém o dispositivo da Lei do Cabo que determina que as operadoras do serviço distribuam gratuitamente ao assinante os canais da televisão aberta, o chamado "must-carry". Porém, no caso da tecnologia digital, foi estabelecido que sua distribuição será objeto de acordo entre radiodifusores e operadoras de TV por assinatura. A proposta, ao mesmo tempo em que assegura o transporte dos canais da televisão aberta e gratuita, permite remunerar as emissoras abertas num futuro próximo.

O projeto ainda determina que, em localidades não cobertas por geradoras de televisão, o acesso aos canais das retransmisoras locais de televisão pela prestadora do serviço de acesso condicionado e a distribuição desses canais para seus assinantes sejam feitas a título gratuito.

Em razão da aprovação da Medida Provisória que instituiu a TV Pública, foi incluído entre os canais obrigatórios, além do canal reservado para a prestação de serviços de radiodifusão pública, o canal oficial do Poder Executivo.

Direitos de imagem de eventos

O projeto estabelece que os atuais operadores de MMDS, DTH, TVA e de outros serviços de interesse coletivo não poderão adquirir direitos de eventos artísticos e esportivos, sendo equiparados às concessionárias de telefonia no que diz respeito à aquisição de direitos dessa natureza. Na primeira versão do projeto, o veto aplicava-se apenas às operadoras de interesse coletivo que se interconectem à rede pública de telefonia. A aquisição dos direitos de transmissão fica, portanto, restrita aos radiodifusores.

Migração

Em relação à transição para o novo serviço, que vai agregar todas as modalidades de TV por assinatura, o projeto determina que os contratos já firmados entre o Poder Público e as atuais prestadoras dos serviços de TV a cabo, DTH, MMDS e TVA sejam extintos com a aprovação do regulamento do SAC, mas ao mesmo tempo permite que a migração seja definida pela prestadora.

As empresas terão seis meses após a aprovação do regulamento do serviço para manifestarem desinteresse em migrar imediatamente para o SAC. Estas prestadoras poderão, então, manter suas atividades até o fim de seus respectivos contratos ou pelo prazo de até cinco anos contados da sua extinção, o que ocorrer primeiro.

Para estimular a migração das atuais prestadoras de serviços de TV por assinatura para o SAC, a proposição concede um ano de isenção do cumprimento de cotas de pacote para operadoras de TV a cabo, MMDS, DTH e TVA que optarem por transformar seus respectivos instrumentos contratuais em termos de autorização para prestação do SAC.

Fomento à produção audiovisual

O substitutivo original previa a instituição de um novo tributo que seria empregado como fonte de recursos para estimular a produção de audiovisual. Na nova redação, o dispositivo foi suprimido, mas foi mantida a destinação de recursos para o fomento da indústria nacional de audiovisual no mesmo montante da proposta inicial.

Para tanto, foi reduzida em cerca de 11% os recursos arrecadados pela Taxa de Fiscalização de Funcionamento prevista na Lei do Fistel e adicionado valor correspondente na Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional), mantendo inalterada a carga tributária dos atuais contribuintes do Fistel, tanto do setor de telecomunicações quanto do de radiodifusão.

O montante estimado, da ordem de 300 milhões de reais, deverá ser utilizado integralmente para o fomento do audiovisual mediante alocação no Fundo Setorial do Audiovisual, sendo que 30% desses recursos deverão ser utilizados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e 10% deve ser destinado aos canais comunitários e universitários, que passam a ser de distribuição obrigatória pelas operadoras de serviço de acesso condicionado.

Emissoras universitárias

A proposta pretende eliminar o debate jurídico em relação à ocupação dos canais universitários. Desde a sua criação pela Lei do Cabo, havia um entendimento majoritário de que somente as universidades poderiam ocupar o canal. Na nova proposta de substitutivo ao PL 29, as faculdades e centros universitários também passam a ter a possibilidade de ocupar o canal destinado às universidades.

Pluralidade de canais jornalísticos

Nos termos do próprio projeto, “nos pacotes em que houver canal de programação gerado por programadora brasileira que possua majoritariamente conteúdos jornalísticos no horário nobre, deverá ser ofertado, no mínimo, um canal adicional de programação com as mesmas características”. Por exemplo, a empacotadora não poderá veicular apenas a GloboNews, tendo que veicular também um outro do mesmo gênero. Diferentemente da versão anterior, que possibilitava participação de 20% da programadora do canal jornalístico nesse canal adicional, a nova versão veta essa possibilidade.

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